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16 de Abril de 2024

Casamento: Conceito e Natureza Jurídica - Parte I

A compreensão do casamento no Direito Civil Brasileiro

há 10 anos

Publicado por Clever Jatobá

Casamento - Parte 1

1. Introdução

A entidade familiar mais tradicional regulada pelo Direito Brasileiro é o casamento[2]. Apesar das infinitas transformações vivenciadas no cenário social brasileiro, quais redesenharam os contornos e o conceito de Família no direito pátrio, o Código Civil, Lei n.º 10.406/2002, em vez de inovar e dar um passo à diante encarando a contemporaneidade, optou pelo conservadorismo e, desprezando a pluralidade das entidades familiares em vigor desde a Constituição Federal de 1988, dedicou-se a exaustivamente disciplinar o casamento como se este ainda fosse o único alicerce do Direito de Família moderno.

Desta forma, o Código Civil Brasileiro buscou de forma exaustiva (e até injustificável) regular pari passo o casamento, de modo que se faz necessário compreendê-lo diante da legislação civil pátria.

2. Do conceito de casamento

Com base no Código Civil Brasileiro, podemos conceituar o casamento como instituto civil[3] pelo meio do qual, atendida às solenidades legais (habilitação, celebração e registro[4]), estabelece entre duas pessoas a comunhão plena de vida em família, com base na igualdade de direitos e deveres, vinculando os cônjuges mutuamente como consortes e companheiros entre si, responsáveis pelos encargos da família[5].

Em outras palavras, podemos dizer que o casamento, sob a ótica do Direito Civil Brasileiro, consiste na entidade familiar constituída com base no atendimento das solenidades legais.

Casamento - Parte 1

3. Da natureza jurídica do casamento

Um dos pontos controvertidos acerca do casamento diz respeito à sua natureza jurídica, ou seja, à compreensão do que é o matrimônio para o direito brasileiro.

Diferente de alguns ordenamentos jurídicos que definiram em lei sua natureza jurídica[6], o Direito Brasileiro deixou este mister à cargo da doutrina, qual, por sua vez se dividiu em três posicionamentos, compreendendo-o como: a) um contrato; b) uma instituição; c) um ato complexo, de caráter híbrido, misto ou eclético.

Para os adeptos da teoria contratualista, o casamento é um negócio jurídico que depende da livre manifestação de vontade das partes para sua realização, de modo a produzir seus efeitos patrimoniais regulados pelo regime de bens, assim, o matrimônio seria um “contrato” a ser apreciado diante do plano da existência, validade e eficácia.

Tal teoria é rebatida por uma corrente que o identifica como uma instituição, pois o mesmo é regido por normas de ordem pública, que define de forma pormenorizada seus efeitos jurídicos, impondo deveres e estabelecendo os direitos dos cônjuges, não podendo ser mitigados pela livre vontade das partes[7]. Outrossim, não poderia se subsumir à condição de um contrato pois o casamento não regula apenas efeitos patrimoniais, mas, também, acarreta efeitos pessoais que não são objetos de um contrato.

Diante do impasse, surge uma terceira corrente que o concebe como um ato complexo de natureza mista, híbrida ou eclética, pois reconhece no mesmo a coexistência de características contratuais com as institucionais. Para esta terceira corrente, a autonomia da vontade das partes se resume apenas à liberdade de escolher o parceiro, o regime de bens e a permanência ou não da relação familiar. Por seu turno, efeitos pessoais como alteração do estado civil, surgimento dos vínculos de parentesco, alteração do nome, deveres de fidelidade e coabitação, entre outros, retiram do casamento sua essência contratualista, já que efeitos pessoais não podem ser regulados por contrato.

Assim, esta terceira corrente sustenta que o casamento é um contrato na sua formação, mas no seu curso é uma instituição, de modo que toma uma feição mista, híbrida e eclética que mescla, de forma mais ponderada, as duas correntes anteriores.

Casamento - Parte 1

Bibliografia

BRASIL. Código Civil Brasileiro

COULANGES, Fustel de. A Cidade Antiga. Trad. Jean Melville. São Paulo: Martin Claret, 2005.

OMENA, Nivaldo Wanderley de. Da Barbárie Ao Humanismo. Salvador: Contemp, 1989.

WALD, Arnold. Curso de Direito Civil Brasileiro: O Novo Direito de Família. São Paulo: Saraiva, 2004.


[1] Clever Jatobá é Advogado e Consultor Jurídico baiano. Mestrando em Família na Sociedade Contemporânea pela UCSal, Aluno do Doutorado em Direito Civil pela Univerdad de Buenos Aires(Argentina). Professor e Coordenador do Curso de Direito da Faculdade Apoio Unifass (Lauro de Freitas), além de Professor da Faculdade Ruy Barbosa, onde também atua como Advogado e Supervisor do Balcão de Justiça e Cidadania da Boca do Rio.

[2] Pelo mundo à fora, registra-se a existência do casamento desde tempos remotos da antiguidade. Porém, o casamento já foi compreendido de várias maneiras distintas, como, por exemplo, diante da ideia de um ritual de passagem, pelo meio do qual se transferia a propriedade da mulher das mãos do pai para o marido (OMENA, 1989); ou o evento religioso que garantia a continuidade dos cultos domésticos aos deuses ancestrais do marido (COULANGES, 2005); ou um sacramento religioso que ligava homem e mulher em uma só carne, numa aliança perante Deus. Em regra o matrimônio sempre teve uma conotação religiosa, mas, perdeu esta essência na França, em 1767, quando o Estado Francês optou por romper com a Igreja e oficializar apenas o Casamento Civil, conforme leciona Arnold Wald (2004).

[3] Conforme prenuncia o Art. 1521 do CCB-02, o casamento é civil. À diante, inclusive, perceberemos que o que se chama de “casamento religioso” faz menção apenas à forma de celebração do matrimônio, uma vez que, para o mesmo ser reconhecido pelo Direito, precisará do atendimento às exigências legais do casamento civil (Art. 1.515 e 1.516 do CCB-02).

[4] Esta é a regra do direito brasileiro. As hipóteses que mitigam esta regra são concebidas como exceções pelo ordenamento jurídico, como, por exemplo o casamento nuncupativo (Art. 1.540 do CCB-02).

[5] Nos termos do caput do Art. 1565 do CCB-02.

[6] O Direito Português, por exemplo, reconheceu a natureza contratual do casamento ao disciplinar no Art.1.5777 do seuCódigo Civill, que o “Casamento é um contrato celebrado entre duas pessoas que pretendem construir família mediante uma plena comunhão de vidas (...)”.

[7] MADALENO, Rolf. Curso de Direito de Família. 5ªed. São Paulo: Gen, Forense, 2013. P.103.


Fonte: http://cleverjatoba.blogspot.com.br/2014/03/casamento-parte-1.html

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6 Comentários

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Por mais que se tente, não há instituto jurídico no direito de família mais seguro do que o casamento. Portanto, a união estável nem de longe oferece as garantias ao casal como o faz o casamento. continuar lendo

Não encontrei na constituição e também no Código Civil, a definição de "estabelece entre duas pessoas a comunhão plena de vida em família", mas sim "Art. 1.514. O casamento se realiza no momento em que o homem e a mulher manifestam, perante o juiz, a sua vontade de estabelecer vínculo conjugal, e o juiz os declara casados.". Assim, quando se refere a homem e mulher, exclui-se "casamento homoafetivo", justificando o termo "União homoafetiva".
Com a recente abertura de discussões sobre casamento e união homoafetiva, me parece que existirá regulamentação para a discussão, não cabendo interpretações para o STF.
É de fundamental importância que ocorra definição desse tema, para encerrar mais uma insegurança jurídica nesse país. continuar lendo

Muito bom! Obrigada! continuar lendo

estou estudado a matéria para prova e devo dizer que esse pequeno resumo é de fundamental importância para um primeiro estudo da eficácia do casamento. continuar lendo